Sobre as pílulas do ajustamento

Cada vez mais, conversando entre amigos, em rodas de bar, filas de banco, no ponto de ônibus ou em qualquer outro lugar, tenho percebido o quão grande é o número de pessoas em uso de medicamentos psiquiátricos (antidepressivos, estabilizadores de humor, hipnóticos, indutores de sono, ansiolíticos, anticonvulsionantes e afins). Até aí, tenho plena ciência de que estamos em uma sociedade doente.


Mas me assusta saber que, ao contrário do que seria esperado, o número de pessoas que buscam psicoterapia não acompanha o "lucro" da indústria farmacêutica (por exemplo, em matéria do site Hypeness, que você pode acessar aqui, o Rivotril foi um dos medicamentos mais vendidos entre 2011 e 2012, sendo que desde lá muitos outros psicofarmacos foram desenvolvidos e estudados).


Vejam bem: não faço uma crítica radical ao uso de medicamentos, e acredito serem de enorme importância para o caminhar de algunsquadros que a psicoterapia não daria conta sozinha, mas o uso de medicação, a meu ver, necessita de um acompanhamento psicológico mais próximo do que consultas bimestrais, que salvo rarissimas exceções, duram apenas quinze minutos.


O mecanismo de qualquer fármaco é o de reduzir o sintoma: um antipirético, por exemplo, em caso de uma infecção, abaixa a febre, mas a bactéria ou o vírus continua lá, firme e forte no organismo, só sendo "derrotado" tomando o antibiótico ou um antiviral corretos para combater este tipo de organismo.


O mesmo acontece com as doenças psíquicas: o medicamento pode "camuflar" o sintoma, nos "tirar" de um estágio de tristeza e até mesmo nos colocar num estágio de felicidade, no caso de uma depressão, por exemplo, buscando apenas o ajustamento do indivíduo a um padrão funcional. Assim como um medicamento de dor ou febre, quando muito utilizado, ou precisa-se de maiores doses, ou a troca do medicamento, sem contar os efeitos colaterais indesejaveis.


Mas muitas vezes, apesar de pesquisas apontarem para a contribuição genética no desenvolvimento de doenças psíquicas, as vivências subjetivas de cada um, sua postura frente a vida e seu meio social são determinantes para a manutenção da doença ou até mesmo o aumento do quadro.


A psicoterapia, se aliada ao tratamento psiquiátrico, é um grande e maravilhoso recurso ao paciente, pois permite elaborar dores psíquicas e avaliar novas formas de lidar consigo mesmo e com as situações ao redor.

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