O HIV de todos nós


Por volta de umas duas semanas, ele, um homem homossexual de família evangélica, me diz, entre outras coisas, que pela sua sexualidade ele seria infeliz, e que um dos destinos "certos" para si era de adoecer.





A doença, que ele não disse, mas pelo contexto, me pareceu ser Aids, uma deficiência no sistema imunológico causada pelo vírus da imunodeficiência humana (HIV), após destruir uma quantidade enorme de células T-CD4, a célula de defesa mais importante do nosso sistema imune. Quando isso acontece, a pessoa se torna vulnerável a infecções que podem levá-la à morte.





Passados quase 40 anos desde o início da epidemia de HIV, na década de 80, controlar a infecção, reduzir a carga viral (a quantidade de vírus circulando no sangue) a quantidades que levam a pessoa a não ter complicações e nem mesmo transmitir o vírus a outras pessoas por via sexual, aumentar a contagem de linfócitos T-CD4, e uma vida saudável foram alcançados por meio de medicamentos. Uma, duas ou mais pílulas diárias fazem este serviço, e muito bem feito.





Mas o HIV ainda está presente nas nossas cabeças, no nosso imaginário. Lembram do rapaz que comentei ali em cima? Ele, assim como muitos homens homossexuais, carregam consigo a percepção de que a Aids é algo "deles", algo que inevitavelmente vai acontecer, e que os "outros", heterossexuais, mulheres, casais de longa data, estão livres, protegidos.





Isso, a gente sabe que não é verdade. Atualmente, exceto em recortes específicos de idade, o HIV não tem encontrado essas distinções e estamos todos vulneráveis a nos encontrarmos com ele em algum momento. Mas já ouviram dizer que quando a gente conta várias vezes uma mentira, ela acaba virando verdade? Então, isso me parece ser algo que vem acontecendo.





Hoje, se em termos biológicos o HIV não afeta tanto quanto antes, por termos medicações, em termos psicológicos e sociais, ele ainda afeta. Ainda mata. Há um conceito de "morte social", que basicamente diz respeito à pessoa que vive com o vírus ser destituída de sua identidade e personalidade para ser lida unicamente como "soropositivo".





Todas formas de separar: eles, os "doentes", de nós, os "saudáveis". Como se isso fosse eterno, estanque, e não pudesse mudar. No tempo que venho trabalhando com questões relacionadas, venho percebido o quanto tem a ver comigo, com você, com todos nós, independentemente do nosso estado sorológico, e não apenas "deles".





Hoje, dia 1º de Dezembro, eu quero propor o enfrentamento ao preconceito, ao estigma, à sorofobia. Quero propor empatia, cuidado.


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